
Psicóloga Especializada em Psicanálise e Saúde pelo Instituto de Ensino e Pesquisa Albert Einstein, a doutora Aleksandra Lopes (CRP 06/123404) destaca a saúde mental como fator muito importante para a pessoa ter uma boa qualidade de vida.
Em 2014, quase 203 mil brasileiros foram afastados do trabalho em razão de episódios depressivos, transtornos de ansiedade, reações a estresse grave e outras questões relacionadas à saúde mental. Dez anos depois, em 2024, os números mais que duplicaram, passando para mais de 440 mil afastamentos em razão de transtornos mentais e comportamentais, recorde da série histórica.
Dados do Ministério da Previdência Social mostram que, na comparação com 2023, os números do ano passado impressionam – o aumento foi de quase 67%.
Nesta entrevista ela fala sobre o problema, suas causas e como cada pessoa deve agir para ter uma boa saúde mental em tempos de tantas mudanças.
SCA – Como cuidar da saúde mental?
ALEKSANDRA - A saúde mental deve ser vista como primordial para ter uma vida de qualidade. Bons hábitos alimentares, cuidado com o corpo, e a qualidade da interação social são hábitos necessários para que a saúde mental seja preservada e protegida.
SÃO CARLOS AGORA - Casa vez mais, brasileiros são acometidos por problemas mentais, como crise do pânico, depressão e etc, Por que ocorre este fenômeno? Tem a ver com a vida moderna?
DOUTORA ALEKSANDRA LOPES - Não é possível justificar a incidência dos casos de transtornos mentais em geral, com base em um único fator. Existem uma série de estímulos externos que nos atravessam e podem desencadear esses transtornos, tais como: pressão no trabalho, preocupações com as exigências da vida, problemas de relacionamentos profissional, pessoal e familiar, o acesso aos meios digitais em excesso, gerando hiper estimulação cerebral, aumentando os níveis de adrenalina e cortisol responsáveis pelos quadros de ansiedade, o uso e abuso de drogas, como fatores ambientais e hereditários podem contribuir para o desencadeamento desses transtornos.
SCA – Como cuidar da saúde mental?
ALEKSANDRA - A saúde mental deve ser vista como primordial para ter uma vida de qualidade. Bons hábitos alimentares, cuidado com o corpo, e a qualidade da interação social são hábitos necessários para que a saúde mental seja preservada e protegida.
SCA - O poder público está preparado para atender a estas novas demandas? Há muita reclamação sobre a falta de neurologistas e psiquiatras?
ALEKSANDRA - O problema da saúde tem sido em função das demandas que os profissionais de saúde encontram e da má remuneração, não esquecendo que a área da saúde é uma área altamente complexa e estressante e que esses profissionais também são afetados pelas dificuldades que a saúde enfrenta, como a baixa remuneração como nos casos dos profissionais que atendem por planos de saúde e o número de pacientes alto que os planos de saúde cada vez mais exigem que o profissional atenda. A dificuldade dos profissionais em ter momentos de descanso, assim como o número reduzido de profissionais que conseguem se manter nesse sistema cada vez mais exigente tem adoecido muito esses profissionais. Cada vez mais vem aumentando a procura desses profissionais por psicoterapia e entre eles estão: os médicos, os agentes de saúde, enfermeiros e fisioterapeutas.
O número de afastamento por Transtorno de Pânico, Ansiedade Generalizada e Bournout vem aumentando.
SCA - O que é o transtorno bipolar? Ele acomete muitas pessoas? Como a família deve lidar com uma pessoa com este transtorno? Como são os relacionamentos de pessoas com este transtorno?
ALEKSANDRA - Transtorno de Personalidade Bipolar é um distúrbio onde a pessoa é acometida por episódios de depressão e euforia.
Existem diferenças no TB Transtorno Bipolar pois eles são divididos em subcategorias :
Transtorno Bipolar tipo I, tipo II, Ciclotimico, Induzido por uso de substâncias.
No TBtipo 1 tem por característica episódios de mania podendo haver ou não episódios depressivos.
No TB tipo 2 tem por característica ao menos um episódio depressivo associado a um episódio de hipomania.
No TB Ciclotímico, tem por característica episódios distintos de mania e depressão maior.
É importante que pessoas diagnosticadas com TB procurem orientação médica e façam psicoterapia para ajudar nas oscilações de comportamento decorrentes do Transtorno.
O TB afeta 140 milhões de pessoas no mundo, de acordo com a OMS , o que nos faz pensar que é um Transtorno encontrado em grande escala na população mundial de maneira geral.
O TB traz muitos prejuízos não só para o paciente, mas para as pessoas ao entorno, uma vez que somos seres de “relação “e a instabilidade emocional causa muitos prejuízos em todas as esferas da vida: pessoal, afetiva, profissional e financeira, uma vez que as relações são marcadas por intensos comportamentos que variam muito e é extremamente desgastante para todos os envolvidos.
Lidar com pessoas que sofrem com este transtorno em especial aquelas que não aceitam nem buscam ajuda, além de extremamente desafiador, traz muitos desgastes como rompimento de relações, divórcios, mágoas e preocupações gerando desiquilíbrios no entorno da vida dessas pessoas também, ou seja; é comum que não só o paciente bipolar sofra, mas qualquer pessoa que se relacione com ele, por isso também o imperativo do cuidado se faz essencial.
SCA - o que é o transtorno borderline? Como ele atinge as pessoas? Como a família deve lidar com alguém assim? Como são os relacionamentos de pessoas com este transtorno?
ALEKSANDRA - Transtorno de Personalidade Borderline, é um transtorno que tem por característica flutuações no humor, na auto imagem nos relacionamentos e no comportamento . Esse transtorno afeta a maneira como a pessoa se vê e vê os outros assim como a forma de lidar com esses desafios que são acompanhados pelo medo intenso do abandono seja real ou não e pela sensação de instabilidade, além de comportamentos impulsivos, mas os sintomas podem variar muito de pessoa para pessoa, em razão da complexidade deste transtorno, o diagnóstico deve ser feito por profissional capacitado.
Os relacionamentos são marcados por idealização e depreciação das pessoas, levando a sentimentos de intenso sofrimento. Em razão desta instabilidade no humor e sua intensidade é difícil para o borderline manter relações pois há constantes sentimentos de vazio e tédio a insatisfação de modo geral com a vida também é muito presente.
O acompanhamento do psiquiatra para a questão medicamentosa como da terapia para apoio e suporte dão qualidade de vida significativa a essas pessoas.
O borderline deve ser olhado com empatia pois sua dificuldade em ter estabilidade emocional, em lidar com as suas questões são extremamente difíceis, gerando muito sofrimento a ele.
Geralmente se encontra uma incapacidade de lidar com a solidão, a expressar inadequada da raiva, trazem problemas muito embora haja um sentimento genuíno de conexão e relacionamentos, mas com grande dificuldade de sustentar isso.
Uma figura pública que podemos afirmar que é borderline, é a Marlyn Monroe, mas ao conhecer seu histórico de vida (abandono materno e paterno, abuso sexual, cobrança da imagem perfeita) é possível perceber que foi fortemente marcada por um triste histórico de vida.
Borderlines em algum momento da vida passaram por condições psíquicas avassaladoras e extremamente traumáticas em seu desenvolvimento Não é por nenhuma condição física ou do nada que esse transtorno ocorre.
SCA - Quais as diferenças entre os dois transtornos?
ALEKSANDRA - Embora ambos os transtornos envolvam condições emocionais significativas elas são diferentes em sua manifestação, duração, causas e tratamento. Nesse sentido, é extremamente necessário um diagnóstico bem feito para dar tratamento e suportes adequados a cada condição.
O Transtorno Bipolar tem base genética / hereditária, enquanto que o Transtorno Borderline não sugere uma base genética como no Transtorno Bipolar.
Pesquisas apontam que fatores genéticos podem contribuir para a condição Borderline, mas não se trata de uma condição essencial.
Embora ambos apresentem a possibilidade de uma questão genética, na condição Bipolar a genética se apresenta mais robusta que na condição Borderline.
A condição exige fatores ambientais como traumas na infância e relações tumultuadas, o que significa que a história de vida é crucial para desenvolver uma personalidade borderline .
Há também diferenças de comportamento em ambas as condições, como na questão do humor, onde as explosões de raiva no borderline costumam ser mais rápidas e repentinas enquanto no Bipolar podem ser mais duradouras e por efeito cumulativo.
O sentimento de vazio na condição Borderline está sempre presente, enquanto que na condição Bipolar é percebida nos episódios depressivos, já que o Bipolar transita entre os dois extremos, euforia e depressão.
A autoimagem no bipolar pode variar de acordo com o pólo que ele que ele está, enquanto que no borderline, é frequente instável e pode mudar rápido.
A impulsividade pode ser evidência com mais facilidade na condição borderline, através de comportamentos de risco, abuso de drogas, comportamentos auto lesivos, relações sexuais e gastos impulsivos como forma de lidar com o vazio (escape).
No Transtorno Bipolar a impulsividade está vinculada a esse momento cíclico de crise.
SCA - Existe cura para o Transtorno Bipolar e para o Transtorno Borderline?
ALEKSANDRA - Esses transtornos não são descritos como algo “curável”, no sentido tradicional, porém, existe uma melhoria significativa nos casos quando eles são acompanhados de tratamento psicológico e medicamentoso. Esses transtornos devem ser acompanhados rotineiramente por psiquiatras e psicólogos, uma vez que são condições crônicas, um modo de enxergar o mundo e em ambos os casos as pessoas podem levar uma vida produtiva e satisfatória desde que façam um tratamento e acompanhamento.
O tratamento em ambos os casos podem incluir moderadores de humor como antidepressivos e ansiolíticos quando se faz necessário.
O mais importante é conhecer os transtornos para evitar julgamentos, rótulos e assim poder efetivamente oferecer apoio e ajudar essas pessoas que sofrem com esses tipos de transtornos.
Foto: A psicóloga Aleksandra Lopes: Bons hábitos alimentares, cuidado com o corpo, e a qualidade da interação social são hábitos necessários para que a saúde mental seja preservada e protegida
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Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil