Itirapinense moldou a criação do MBA em IA e Big Data na USP São Carlos
Professora Roseli Aparecida Francelin Romero transforma tecnologia em soluções para o avanço da sociedade
16 DEZ 2024 • POR Gabriele Maciel • 14h05Aos 12 anos em Itirapina, interior de São Paulo, Roseli Aparecida Francelin Romero já demonstrava aptidão com os números e também em lecionar. Primeira aluna da classe, ela dava aulas particulares para ajudar colegas e, ainda na infância, descobriu na prática o poder transformador do conhecimento compartilhado. Atualmente, com uma trajetória marcada pela excelência acadêmica e pela contribuição à pesquisa em robótica social e interação humano-robô, a primeira coordenadora do MBA em Inteligência Artificial e Big Data da USP São Carlos é reconhecida como uma das principais especialistas da área no Brasil. Foi Roseli que, em 2017, idealizou a Escola Avançada de Big Data e Inteligência Artificial, que depois serviu como alicerce para a criação, planejamento e desenvolvimento do MBA, o primeiro no Brasil que une as duas áreas da tecnologia.
A carreira da professora Roseli perpassa todas as áreas da tecnologia, com enfoque sempre na união entre pesquisa e ensino, os quais buscam transformar a tecnologia em ferramentas para melhorar a sociedade e instigar a evolução tecnológica para o futuro. "Com base na experiência acumulada, ampliamos o escopo e desenvolvemos um programa mais robusto, com maior carga horária e foco em atender às demandas emergentes da área", explica a professora.
Formação
Após concluir o Ensino Médio em sua cidade natal, Itirapina, a família de Roseli decidiu se mudar para São Carlos, permitindo que ela frequentasse um cursinho preparatório. Determinada, Roseli ingressou no Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, onde se formou em Matemática com ênfase em Computação. Mais tarde, destacou-se novamente ao ser a única de sua turma a conquistar uma bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) para o mestrado, um feito que ela considera “crucial para seguir em frente e progredir na carreira”.
Durante o doutorado em Engenharia Elétrica pela Unicamp, Roseli especializou-se em redes neurais artificiais, consolidando seu interesse pela inteligência artificial. Mas foi no pós-doutorado, na Carnegie Mellon University, em Pittsburgh, nos Estados Unidos, que sua carreira deu um salto significativo, desenvolvendo pesquisas na área da IA aplicada à robótica social. Sob a orientação de líderes como Sebastian Thrun, precursor dos veículos autônomos do Google, ela integrou um grupo de elite que a motivou a aplicar a IA em problemas reais. “Foi uma experiência transformadora. Ali percebi como a teoria e a prática podem se unir para criar soluções impactantes”, afirma.
Lá a professora desenvolveu um sistema para reconhecimento de gestos utilizando redes neurais artificiais, que até hoje é um dos trabalhos mais citados. Para isso, o robô deve reconhecer diferentes gestos feitos por um humano, interpretar e tomar uma ação correspondente. Este trabalho contribuiu para pesquisas na área de interação humano-robô, que é uma área em constante ascensão tanto no exterior quanto no Brasil.
Desde então, Roseli coordena o Laboratório de Aprendizado de Robôs (LAR) no ICMC, onde lidera projetos que combinam aprendizado de máquina, visão computacional e tomada de decisão.
Futebol de robôs
Um dos marcos de sua carreira foi o trabalho com futebol de robôs, que começou como um desafio técnico e rapidamente se tornou uma das áreas mais reconhecidas de seu grupo de pesquisa. O projeto rendeu prêmios nacionais e internacionais em competições de robótica, consolidando sua equipe como referência na área. Além disso, o grupo foi pioneiro no uso de impressão 3D para criar carcaças de robôs, uma inovação que inspirou outras universidades no Brasil a adotarem esse modelo e expandirem suas próprias iniciativas. "Foi extremamente gratificante ver nosso trabalho ganhar reconhecimento e se tornar uma referência na área de robótica", ressalta Roseli.
Defensora da inclusão tecnológica desde o ensino básico, Roseli dedica-se a organizar e publicar livros sobre IA aplicada à robótica, promovendo o acesso ao conhecimento de forma ampla e acessível. "A educação é a chave para democratizar o acesso à tecnologia", enfatiza. Um exemplo de sua contribuição é o livro Robótica Móvel, que recebeu o Prêmio Jabuti 2015, conquistando a segunda colocação na categoria Engenharias, Tecnologias e Informática, um reconhecimento que ressalta a relevância de seu trabalho para o avanço da ciência e da educação.
Recentemente, Roseli organizou o livro Robótica Educacional, publicado pela Editora da USP, com o objetivo de suprir uma importante lacuna na disponibilização de conteúdos voltados para alunos e professores. “Este livro apresenta conteúdos referentes à estratégia de IA para programação de kits robóticos com aplicação aos desafios da Olimpíada Brasileira de Robótica”, explica a pesquisadora.
Vida equilibrada
Fora dos laboratórios e salas de aula, a professora do ICMC encontra equilíbrio em atividades ao ar livre. “Estar em contato com a natureza é essencial para mim. Caminhadas e cuidar do jardim me ajudam a recarregar as energias”, comenta. Sua preocupação com o meio ambiente também se converte em pesquisas, como as que ela desenvolveu em colaboração com a OHIO University, e que culminou em um sistema autônomo com o uso de drones para mapeamento de florestas e detecção de queimadas.
A preocupação com o bem-estar humano também motiva a professora Roseli a conduzir pesquisas inovadoras em diferentes áreas. Um de seus focos é a saúde mental, especialmente voltada para crianças com algum tipo de deficiência. Em uma de suas iniciativas, ela e sua equipe estão desenvolvendo um sistema para reconhecimento de atividades humanas, que poderá ser utilizado tanto no cuidado com idosos quanto no monitoramento de movimentos em academias, com o objetivo de verificar se os exercícios estão sendo realizados corretamente, contribuindo para a saúde física e mental.
Outro projeto relevante liderado pela pesquisadora é o desenvolvimento de um sistema integrado que utiliza robôs humanoides como recurso lúdico em processos de diagnóstico psicológico com crianças. A interface do sistema foi projetada para gerenciar tanto as funções do robô quanto a atuação do psicólogo, criando um ambiente de interação acolhedor.
“O robô, teleoperado, possui voz infantil e movimentos simples, e auxilia na superação da resistência que algumas crianças apresentam durante sessões de avaliação psicológica ou terapia”, explica Roseli. Esse sistema tem sido validado em diversos experimentos realizados em parceria com o Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e a Unesp de Botucatu.
Além disso, Roseli explora o uso da robótica social no aprendizado de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA), síndrome de Down e deficiências motoras. Trabalhando em colaboração com Apaes, ela desenvolve sistemas que facilitam o aprendizado e promovem o desenvolvimento dessas crianças. “Tenho uma amiga com uma sobrinha autista, e isso me fez perceber o quanto é importante criar ferramentas que realmente ajudem essas crianças e suas famílias”, compartilha a pesquisadora.
Quanto ao futuro, Roseli sonha em ampliar o alcance de seus trabalhos, traduzindo seus livros para o inglês e espanhol e continuando a formar líderes na área de IA. “Minha motivação é deixar um legado que combine ciência, educação e impacto social”, conclui.
O futuro da IA
Roseli acredita que a integração entre academia e mercado é essencial para maximizar o impacto da IA na sociedade. Como vice-coordenadora do MBA em Inteligência Artificial e Big Data, ela trabalha para preparar profissionais capazes de enfrentar os desafios de um mundo movido a dados. “Nosso objetivo é oferecer uma formação sólida, tanto técnica quanto estratégica, conectando a inteligência artificial aos problemas concretos enfrentados pelas empresas e instituições.”
Com seu trabalho no MBA e no LAR, Roseli continua moldando o futuro da IA no Brasil, inspirando novas gerações de cientistas e consolidando a USP como um dos principais centros de excelência na área. "Ainda temos muito a contribuir, tanto em termos de pesquisa quanto na formação de líderes para a transformação digital do país", conclui a professora, cujo legado acadêmico e profissional é exemplo de dedicação e inovação.