Artigos científicos com Kleber Chicrala

Fotobiomodulação cerebral

21 JUL 2024 • POR Kleber Jorge Savio Chicrala • 08h26
Fotobiomodulação Transcraniana com lasers vermelhos e infravermelhos (Vacum Laser, MMOptics, São Carlos, SP, Brasil) (Arquivo pessoal da autora).

Profa. Dra. Rosane F. Z. Lizarelli - (Docente e Gestora da Clínica-Escola NILO, RP e Pesquisadora-Colaboradora do CEPOF - INCT - IFSC-USP

A Fotobiomodulação (FBM) tem como objetivo primeiro restabelecer a homeostase fisiológica, através de incremento energético ou corrigir falhas celulares (Karu, 1986). Irradiar com a dosimetria correta se constitui na chave para o sucesso. A FBM do cérebro é uma abordagem em rápido crescimento para melhorar as funções cerebrais, bem como tratar uma ampla gama de doenças, incluindo distúrbios neurodegenerativos, traumáticos e psiquiátricos. A técnica envolve principalmente o fornecimento de luz vermelha e/ou infravermelha próxima à cabeça usando um capacete de diodo emissor de luz (LED), um conjunto de LED ou um laser puntual. No entanto, outras abordagens de fornecimento de luz são por vezes utilizadas, com base na aplicação de luz intranasal, abdominal ou mesmo intravascular (Hamblin, 2022).

Quando o tecido-alvo, ou melhor, quando o órgão-alvo for o cérebro, então essa dosimetria abre um portal de possibilidades para o clínico. Isso porque, não apenas o comprimento de onda e todas as outras grandezas físicas (energia, potência, irradiândia e densidade de energia, por exemplo) devam ser consideradas, mas, muito importante e inovador, de aplicação torna a Fotoneuromodulação em uma modalidade oportuna e complementar, principalmente no que se refere a saúde integrativa e bem-estar.

O que nos parece óbvio é que o laser deva ser entregue através de um orifício criado no alto da cabeça, e sim, seria a via intracraniana, entretanto será que a luz necessita de uma abertura física artificial para atingir o alvo... e qual seria ele?

Na verdade, alguns trabalhos científicos têm respaldado o que já encontramos na clínica: podemos aplicar os lasers e/ou LEDs (diodos emissores de luz) em baixa intensidade através do crânio e utilizar vias naturais que sejam condutoras de luz (Salehpour et al., 2018; Lin et al., 2024). As vias já em uso e estudadas são: transcraniana, transpalatal, transmeatal, intranasal, vascular (artérias carótidas e vertebrais) e transabdominal. A via remota acessando células-tronco de ossos longos (ossos do antebraço - ulna, ou da coxa – fêmur) também podem trazer ganhos na saúde do cérebro (Tuby et al., 2011; Oron et al., 2014; Blatt et al., 2016).

Quando irradiamos, com lasers ou com dispositivos a base de LEDs (diodos emissores de luz), a pele ou couro cabeludo das regiões de face ou cabeça, podemos promover uma modulação fotônica cerebral pela via transcraniana (Fig. 1). Há evidências claras de que algumas, embora minúsculas, quantidades de luz são, efetivamente, transmitidas para partes mais profundas do cérebro após tratamento externo com FBM (fotobiomodulação) na cabeça. Há evidências surpreendentes de que as células humanas do sistema visual, sejam capazes de detectar apenas um único fóton (Tinsley et al., 2016; Ala-Laurila e Rieke, 2014).

Segundo Arany (2019), a fotobiomodulação fornece uma abordagem não invasiva para modular o cérebro humano para benefícios terapêuticos, além de servir como uma ferramenta de descoberta para entender melhor sua complexidade e funções normais.

A irradiação da região do córtex pré-frontal ventromedial tem apresentado melhoras cognitivas e sociais (Cheung et al., 2023; Pan et al., 2023; Stephan et al., 2022); já a irradiação do córtex frontal dorsolateral pode auxiliar no tratamento de depressão e cefaleias (Cassano et al., 2018; Tomaz de Magalhães et al., 2016).

Mas, podemos ir muito além! Prevenção do envelhecimento cerebral (Cardoso et al., 2021); melhora do sistema glinfático (Salehpour et al., 2022), tratamento de distúrbios neurais tais como autismo (Hamilton et al., 2022), bipolaridade (O'Donnell et al., 2021), ansiedade e depressão (Eshaghi et al., 2019; Farazi et al., 2022), distúrbios do sono (Vandewalle et al., 2011; Valverde et al., 2023), além das doenças degenerativas mais conhecidas e estudadas como Alzheimer (Iosifescu et al., 2017; Liu et al., 2023) e Parkinson (Herkes et al., 2023; McGee et al., 2023).

Ambos, lasers e LEDs são benvindos, entretanto as faixas espectrais mais estudadas e indicadas são vermelhos e infravermelhos próximo, principalmente 808 e 810nm. Essa faixa do infravermelho próximo apresenta uma maior profundidade de penetração no tecido biológico e, com a densidade de energia e potência adequados, terá menor atenuação, atingindo os tecidos-alvo cerebrais com a dose almejada. Com relação às doses, quando emitem no modo contínuo, giram em torno de 18J, mas no modo pulsado podem ter uma maior variação de parâmetros. Com relação ao número de sessões, parece que cada enfermidade tem uma demanda, mas no tratamento das doenças neurodegenerativas, as irradiações devem ser continuadas, e, muitas vezes, combinadas com dispositivos para uso caseiro.

Mas há outras vias menos óbvias que podem ser utilizadas.

As mucosas intranasais são ricas tanto em tecido neural quanto em vasos sanguíneos, dessa forma, irradiar esses tecidos resulta em melhora metabólica local (Kastyro et al., 2021), mas também aciona o sistema naso-cérebro-linfático que é uma via para a administração de medicamentos ao cérebro.

No método FBM intranasal, a fonte de luz está localizada dentro da narina na parte posterior do nariz e devido à espessura mais fina da placa etmoidal, pode irradiar diretamente subcortical (hipotálamo, tálamo, amígdala, hipocampo) e cortical (córtex orbitofrontal) estruturas do sistema límbico no cérebro que estão relacionadas aos distúrbios neurológicos e neuropsiquiátricos, tais como Doença de Alzheimer e Doença de Parkinson (Lim, 2013; Salehpour et al., 2020).

A Fotobiomodulação Intranasal também é uma opção para tratamento de rinite alérgica (Kang et al., 2022; Csoma et al., 2004), anosmia pós-COVID19 (Soares et al., 2021), auxilia na saúde neuromuscular (Johnson et al., 2024) e melhora dos parâmetros sanguíneos em mulheres gestantes (Gao et al., 2008). A sugestão de protocolos é aplicar, de 6 a 18J de energia total por narina, com laser emitindo no infravermelho próximo, de 2 a 3 sessões semanais.

A Fotobiomodulação Transmeatal descreve a aplicação de lasers ou de dispositivos a base de LEDs que são introduzidos dentro da orelha, permitindo uma atuação da luz local e sistemicamente (Bacelete; Gama, 2021).

A FBM para tratar o cérebro através do canal auditivo também foi sugerida, a fim de beneficiar o transtorno afetivo sazonal (Timonen et al, 2012; Jurvelin et al., 2014) e a modulação da função cerebral (Sun et al, 2016).

Salehpour et al. (2018) relataram que a via transmeatal pode superar as limitações e fornecer irradiação eficaz para o cérebro, através do conduto auditivo penetrando nas estruturas do lobo temporal, estruturas menos sólidas facilitando irradiação e a modulação da função cerebral e beneficiar o transtorno afetivo sazonal.

Além disso, a FBM Transmeatal, em relação ao zumbido, aumenta a proliferação celular, a síntese de ATP, colágeno, promove o fluxo sanguíneo local na orelha interna ativando mecanismos de estimulação fotoquímica e fotofísica das mitocôndrias das células ciliadas (Siedentopf et al., 2006).

Para obter uma fluência adequada no sistema nervoso central humano, também foi sugerida uma combinação de irradiação de luz através do seio esfenoidal e da cavidade oral (Pitzschke et al, 2015).

Quando irradiamos o centro do palato mole, conseguimos entregar luz diretamente no sistema límbico. O sistema límbico responde pela sociedade, fome, memória e resposta emocional.

Realizar a Fotobiomodulação Transabdominal nos permite acessar uma via que visa restabelecer o eixo Intestino-cérebro, ou seja, devolver a comunicação, através do nervo vago, desses dois centros, desinflamando o intestino, estimulando a produção de neurotransmissores e acelerando o metabolismo sistêmico. Já é sabido que o intestino comporta um microbioma que tem sido, cada vez mais, estudado e valorizado, isso porque temos uma relação simbiótica e dependente dos microrganismos “bons” que nos auxiliam produzindo, inclusive neurotransmissores essenciais para a sinalização cerebral equilibrada. Dessa forma, fica claro que nosso intestino não pode ter seu microbioma alterado, nem mesmo apresentar uma inflamação crônica, o que poderia comprometer o bom funcionamento sistêmico e inclusive, do eixo intestino-cérebro.

Liebert et al. (2019) conclui na vossa revisão que os efeitos agora demonstrados do FBM no microbioma, bem como outros efeitos da luz no microbioma, incluindo a modulação dos ritmos circadianos, a presente perspectiva introduz um novo termo "fotobiômica" e aguarda com expectativa a aplicação do FBM para influenciar o microbioma em humanos. Wang et al. (2019) avaliaram os efeitos da FBM no declínio cognitivo em camundongos e descobriram que, surpreendentemente, a composição da microbiota intestinal em camundongos APP/PS1 tratados com luz MIR retornou aos níveis normais (camundongos do tipo selvagem).

Siposan e Lukacs (2001) apresentaram um resultado muito importante após a irradiação com laser 632,8nm de sangue fresco, o efeito da laserterapia de baixa intensidade (fotobiomodulação) nas hemácias confirma o mecanismo não ressonante desse efeito bioestimulante, pelas alterações ocorridas na membrana celular (no nosso caso, células sanguíneas), pela revitalização das capacidades funcionais dos glóbulos vermelhos e por diversos efeitos bioquímicos ao nível da membrana. Os efeitos físico-bioquímicos e biológicos causados pela FBM do sangue podem influenciar os parâmetros físico-químicos necessários para o armazenamento a longo prazo dos hemoderivados. Esses efeitos também podem levar a uma revitalização mais rápida da membrana eritrocitária (que foi submetida à ação de alguns fatores físicos e bioquímicos durante o processo de preservação), para exercer sua função oxifórica em procedimentos transfusionais. As funções oxifóricas são a capacidade dos eritrócitos de fornecer oxigênio aos tecidos do corpo. Essa condição somada à melhora da deformabilidade dos eritrócitos pode promover algumas circunstâncias fundamentais para facilitar a recuperação da homeostase: melhor circulação sanguínea nos nanocapilares e melhor entrega de oxigênio. Os nanocapilares estão presentes em órgãos nobres, sendo as estruturas responsáveis pela oxigenação e seu funcionamento eficiente. Assim, parece claro dizer que a FSV (Fotobiomodulação Sistêmica Vascular) parece garantir o melhor metabolismo de vários órgãos importantes em todo o organismo.

Em conclusão, empregar a Fotobiomodulação Cerebral como uma abordagem clínica nas áreas da saúde deve fazer parte do arsenal não-invasivo e integrativo que deve ser instituído para beneficiar todos os nossos pacientes. O profissional da saúde que não estiver apto a realizá-lo, deve habilitar-se e oferecer em seus atendimentos para alcançar resultados sistêmicos muito mais abrangentes e eficientes.

Fontes: Profa. Dra. Rosane F. Z. Lizarelli - Docente e Gestora da Clínica-Escola NILO, RP e Pesquisadora-Colaboradora do CEPOF - INCT - IFSC-USP; e Ms. Kleber Jorge Savio Chicrala – Jornalismo Científico e Difusão Científica – CEPOF – INCT – IFSC - USP