Artigo Rui Sintra

Quando alguém diz que “está na hora de retribuir o investimento que o país fez em mim”

7 ABR 2023 • POR (*) Rui Sintra • 07h00

Há já alguns anos que tine o privilégio de conhecer Laís Canniatti Brazaca (31), natural de Piracicaba. Diariamente nos encontrávamos com ela nos corredores e laboratórios da USP de São Carlos e não foram raras as vezes que com ela dividi seus projetos, seus estudos, suas pesquisas, que foram vertidas não só nas mídias sociais como em canais de TV, na forma de divulgação científica. Sempre ficava extasiado perante seus olhos inquietos, inquiridores, numa ânsia enorme de explicar o que tinha descoberto, o que tinha vivenciado e quanto tudo isso era importante para sua vida e para o desenvolvimento científico do país. Em entrevista feita por mim para o portal do Instituto de Física de São Carlos (USP), Laís Brazaca confessou que sempre foi igual a qualquer criança no ensino fundamental e assim que concluiu o ensino médio prestou provas para entrar na UFSCar e na USP de São Carlos.

A importância de um curso

Embora desde muito cedo se tenha sentido apaixonada pela área de Exatas, principalmente pelas disciplinas de Física, Química e Biologia, o certo é que Laís Brazaca não sabia precisamente o rumo que deveria tomar nessa imensa área do conhecimento. “Eu sempre tive - e ainda tenho - muitas dificuldades com disciplinas relacionadas à área de Humanas, ao contrário das Exatas que me instigavam a estudar, questionar, investigar. Já no ensino médio eu sabia muito bem que queria combinar Exatas com alguma parte biológica, e foi a partir daí que pensei em Engenharia. Pensei em Biotecnologia, mas, de repente, ao ler aquele livrinho da Fuvest, me deparei com a área de Ciências Físicas e Biomoleculares, a combinação certa daquilo que eu mais gostava no ensino médio e fui aprender mais sobre esse curso que acabava tendo mais Física do que a maioria das pessoas imaginam. Em 2009 prestei vestibular para a área de Biotecnologia, na UFSCAR, e para a área de Ciências Físicas e Biomoleculares na USP de São Carlos. Deu sorte, pois passei em ambos, tendo optado, então, por ingressar no Instituto de Física de São Carlos (USP), nesse curso”, recorda Laís.

Foram quatro anos de um curso cujo conteúdo era, segundo Laís Brazaca “exatamente como eu tinha pensado”, indo plenamente ao encontro daquilo que ela procurava desde o início. O curso de Ciências Físicas e Biomoleculares foi a base que Laís necessitava para toda a pesquisa que iria desenvolver nos anos seguintes e que abriria portas rumo a diversos destinos científicos. “Desse curso extraí toda a base da área de pesquisa porque, na realidade, os alunos que cursam essa área podem escolher diversos caminhos”, acrescenta a pesquisadora.

Seu interesse aumentou exponencialmente quando assistiu a uma palestra ministrada pelo Prof. Valtencir Zucolotto sobre biossensores. “Foi devido a essa palestra, que aconteceu ainda no primeiro semestre do 1º ano do curso, que decidi começar a fazer iniciação científica com esse professor, no grupo que agora se chama GNano, e por ali me mantive ao longo de toda a graduação, nunca imaginando que minha vida acadêmica continuaria pelos anos seguintes naquele grupo fantástico que me abriu as portas do conhecimento”, salienta Laís Brazaca.

A graduação de Laís terminou em finais de 2012 e ela não teve qualquer dúvida em iniciar seu mestrado no GNano, que, segundo ela, foi um processo natural. “Foi nesse período que desenvolvi um biossensor para detecção de um hormônio que se chama adiponectina e que pode ser aplicado para muitas coisas, mas mais especificamente para o Diabetes Tipo-2, já que ele faz um diagnóstico preditivo. Foi um trabalho muito bom, que me preparou para essa área do desenvolvimento de biossensores, um caminho que continuei no meu doutorado, também no GNano, entre 2015 e 2019 ”, pontua a pesquisadora. Já o destaque no doutorado de Laís Brazaca foi a pesquisa sobre Alzheimer,  através do desenvolvimento de um dispositivo em papel que pudesse auxiliar no diagnóstico dessa doença, um trabalho que rendeu bastantes elogios à pesquisadora.

A experiência no exterior

No desenvolvimento de seu doutorado, Laís Brazaca teve a oportunidade de fazer dois estágios no exterior: um em Oviedo, na Espanha, durante dois meses, e outro em San Diego (EUA), por um período de nove meses, onde trabalhou no desenvolvimento de sensores vestíveis, experiências que foram essenciais para seu desenvolvimento científico.

Depois de muitos anos ligada ao GNano, Laís Brazaca decidiu fazer seu pós-doutorado no Instituto de Química de São Carlos (IQSC/USP), igualmente na área de sensores, sob a coordenação do Prof. Emanuel Carrilho. Ao longo dos anos de 2019 e 2020, nossa entrevistada prosseguiu seus estudos e pesquisas, até que em 2021 foi contratada como professora-colaboradora, algo que  abriria uma porta à pesquisadora e que anteriormente apenas se configurava como um sonho - ser professora. “Sempre tive muito claro que queria ser professora na USP, até porque minha mãe foi professora na ESALQ/USP e eu sempre tive esse espelho, sempre quis seguir esses passos”, sublinha Laís.

Em 2022, Laís Brazaca decide fazer um novo pós-doutorado  no exterior e parte para a Universidade de Harvard (EUA), onde durante um ano desenvolve suas pesquisas, tendo regressado agora, em 2023. “Foi uma experiência muito interessante, não só no que diz respeito à área de pesquisa, como também à oportunidade que eu tive de aprender a gerenciar um grupo de cientistas. E, em Harvard, o ambiente é muito rico, tem uma diversidade cultural muito grande, com eventos a acontecerem o tempo inteiro sobre assuntos diferenciados e com pessoas que são grandes especialistas. Foi fantástico, mas, contudo, eu queria voltar para o Brasil”, pontua a pesquisadora.

Profissão - Professora

E esse regresso de Laís Brazaca ao Brasil foi devido à sua intenção de concorrer a uma posição de professora no IQSC/USP. “Não renovei o meu contrato em Harvard, já que minha vontade sempre foi ficar no Brasil por muitos motivos. Principalmente porque toda a minha carreira científica foi feita aqui e sinto que agora, que estou pronta para produzir artigos com uma qualidade superior, está na hora de retribuir o investimento que meu país fez em mim. A ciência precisa de nós. Aqui é a minha casa e também quero formar pessoas”, salienta a pesquisadora.

A partir do meio deste mês de abril, Laís Brazaca irá dar aulas na área de química analítica e nessa nova vertente profissional, como professora, a pesquisadora entende que o melhor caminho será dar atenção ao aluno, estimulá-lo, sempre dar o melhor nas aulas “Para que eles possam ir mais longe do que nós fomos. Deixá-los curiosos, mais interessados. Acredito que se você deixar o aluno curioso e permitir que ele busque o seu próprio caminho, que desvende os mistérios que se colocam na sua frente, é uma das melhores coisas que podemos fazer por ele. Porque aí não depende mais tanto de você, não é? A pessoa começa a ter um pouco mais de iniciativa, começa a se estimular”, conclui Laís.

Desejo à (agora) Profª Laís Brazaca, muita Luz em seu caminho.

O autor é jornalista profissional / correspondente para a Europa pela GNS Press Association  / EUCJ - European Chamber of Journalists / European News Agency) - MTB 66181/SP.

Esta coluna é uma peça de opinião e não necessariamente reflete a opinião do São Carlos Agora sobre o assunto.