
A sobretaxação dos Estados de Unidos de 10% sobre os produtos brasileiros, anunciada nesta quarta-feira, 2 de abril pelo presidente norte-americano Donald Trump, pode representar desafios significativos para as empresas brasileiras que são exportadoras exportadoras, especialmente em setores com alta dependência do mercado norte-americano.
“Produtos como aço, alumínio, café e carnes terão custos elevados devido às tarifas de 10%, o que pode reduzir a competitividade e pressionar as margens de lucro. Setores estratégicos, como siderurgia (CSN, Usiminas) e aeronáutica (Embraer), estão entre os mais expostos”, afirma o advogado tributarista e especialista em comércio exterior, Jean Paolo Simei e Silva, sócio da Advocacia Fonseca Brasil.
Segundo Simei e Silva, a Embraer, por exemplo, que tem uma indústria de aviões em Gavião Peixoto, estima perdas de até 9% no EBITDA em 2025. “Pequenas empresas, embora menos impactadas diretamente, poderão enfrentar maior concorrência interna se as grandes exportadoras redirecionarem parte de sua produção para o mercado doméstico. Para mitigar esses efeitos, estratégias como diversificação de mercados (priorizando China, União Europeia e países asiáticos) e ajustes nos preços serão essenciais”, explica o especialista.
No que se refere ao câmbio, Simei e Silva explica que os impactos são ambíguos. Inicialmente, o real apresentou valorização (para R$ 5,62), refletindo alívio diante de tarifas menores comparadas às impostas a outros países. “Contudo, a médio prazo, a possível redução no fluxo de dólares (devido à queda nas exportações) e os juros elevados nos EUA poderão pressionar a moeda brasileira, aumentando a volatilidade. Essa depreciação potencial do real, aliada à alta nos custos de importação, poderia agravar a inflação doméstica, especialmente em setores dependentes de insumos estrangeiros. Analistas ressaltam, porém, que a relativa "fechadura" da economia brasileira (com exportações representando apenas 18% do PIB) tende a amortecer oscilações extremas”, comenta.
JANELAS DE OPORTUNIDADES - Apesar dos desafios, o Brasil tem oportunidades claras. O advogado ressalta que as tarifas mais altas sobre a China (34%) e o Vietnã (46%) abrem espaço para que commodities brasileiras, como soja, minério de ferro e petróleo, ganhem mercado nos EUA, especialmente com a substituição de fornecedores como a Venezuela. “Além disso, o país pode atrair investimentos de empresas chinesas e asiáticas que buscam alternativas para operações globalizadas. A aprovação do acordo Mercosul-UE e parcerias com países como Japão e Vietnã são caminhos para diversificar mercados, principalmente para produtos como etanol e bens industrializados. Entretanto, setores como aeronáutica enfrentam dificuldades para substituir compradores, dada a dependência de contratos de longo prazo com os Estados Unidos”, destaca.
GUERRA SEM VENCEDORES - Sobre a guerra comercial, o especialista afirma que é improvável que haja vencedores absolutos. “Os EUA, embora busquem proteger indústrias locais, podem ver sua inflação interna pressionada pelo repasse de custos de produtos importados, além de riscos aos lucros de multinacionais como Apple e Tesla. Globalmente, o pacote tarifário de Trump pode desencadear recessão, com quedas em bolsas como S&P 500 e impactos em economias asiáticas e europeias. A hegemonia norte-americana, embora não desapareça, perde força diante da ascensão de polos alternativos, como a China, que fortalece laços com o Brasil e a América Latina”, diz Simei e Silva.
Outras questões relevantes, segundo ele, incluem a inflação indireta no Brasil, decorrente do encarecimento de insumos importados (tecnologia, máquinas), e a desestruturação de cadeias produtivas globais, que elevam custos em setores como siderurgia. O PL 2.088/2023, que autoriza retaliações comerciais proporcionais, coloca o Brasil em posição estratégica, mas a diplomacia tem priorizado negociações multilaterais na OMC para evitar escaladas conflituosas.
“Em suma, o tarifaço impõe ajustes imediatos, mas também catalisa oportunidades. Para o Brasil, a aceleração de acordos comerciais (como Mercosul-UE), a atração de investimentos em tecnologia e a priorização do multilateralismo são estratégias-chave. A guerra comercial reforça tendências de multipolaridade econômica, posicionando o país como ator relevante, desde que equilibre pragmatismo e inovação”, conclui Simei.