
Apesar de ser responsável por cerca de 70% das emissões de gases de efeito estufa do Brasil, o agronegócio não está incluído na legislação do mercado regulado de carbono. A dra. Adriana de Paiva, advogada especializada em direito ambiental e sócia fundadora do Verri Paiva Advogadas, afirma que esta situação está errada.
“Consideramos um equívoco a exclusão do agronegócio do mercado regulado de carbono. Segundo o Observatório do Clima, responsável pelo Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa, o agronegócio é responsável por cerca de 70% das emissões de gases de efeito estufa do Brasil, principalmente devido à pecuária e ao desmatamento associado à expansão agrícola”, comenta Adriana.
Segundo ela, a exclusão desse setor compromete a eficácia das políticas climáticas do país e impede a criação de incentivos para que os produtores adotem práticas mais sustentáveis. “Incluir o agronegócio no mercado de carbono poderia ainda gerar receitas adicionais para os agricultores que adotem práticas de redução de emissões, estimulando a transição para uma agricultura mais sustentável”, explica a advogada.
Adriana de Paiva destaca que para equilibrar essa situação é importante implementar um conjunto de medidas que promovam a inclusão do agronegócio no mercado de carbono e incentivem práticas sustentáveis.
“Algumas estratégias incluem incentivos financeiros, com a criação de programas de compensação para agricultores que adotam práticas sustentáveis, como a recuperação de áreas degradadas, o uso de tecnologias de agricultura de precisão e a rotação de culturas; promover programas de formação para agricultores sobre práticas que reduzem emissões e aumentam a resiliência das culturas, como agroflorestas e sistemas de integração lavoura-pecuária-floresta; investir em pesquisa e desenvolvimento de novas tecnologias que possam melhorar a eficiência do uso de recursos e reduzir as emissões, como biocombustíveis de segunda geração ou fertilizantes de baixo impacto; e estimular colaborações entre o setor privado, governo e organizações não governamentais para a implementação de práticas agronômicas sustentáveis em larga escala”, destaca a especialista.
Ela comenta ainda o papel da Embrapa que tem sido fundamental na pesquisa e desenvolvimento de tecnologias que promovem a sustentabilidade no agronegócio. “Como exemplo, podemos citar a pesquisa da Embrapa em agricultura de precisão, com a utilização de tecnologias como drones e sensores para monitoramento do solo e das culturas, permitindo um uso mais eficiente de insumos e reduzindo o desperdício; manejo sustentável do solo com técnicas como a plantio direto, que protege o solo e aumenta sua capacidade de sequestrar carbono; Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), que consiste em sistemas que combinam a produção de grãos, pecuária e reflorestamento, aumentando a eficiência do uso da terra e promovendo a biodiversidade; desenvolvimento de biotecnologia com variedades de culturas mais resistentes a pragas e doenças, exigindo menos defensivos agrícolas; e uso de bioenergia com incentivo a produção de biocombustíveis a partir de resíduos agrícolas, como bagaço de cana ou casca de arroz, contribuindo para a redução das emissões”, relata.

SETOR SUCROALCOOLEIRO COMO MODELO - Adriana aposta que o setor sucroalcooleiro se recuperou da crise que enfrentava ao produzir energia elétrica através do bagaço da cana, pode servir como um modelo para outros setores do agronegócio. “A experiência do setor sucroalcooleiro demonstra que a produção de energia a partir da biomassa pode ser uma alternativa viável e sustentável. Outros setores do agronegócio também poderiam se beneficiar. Na pecuária, poderiam ser utilizados resíduos animais e restos de pastagens para a produção de biogás”, afirma.
Segundo a advogada, resíduos de culturas de milho e soja podem ser convertidos em biocombustíveis ou utilizados para a geração de energia, contribuindo para uma economia circular. Resíduos orgânicos de frutas e vegetais podem ser transformados em compostagem ou biocombustíveis, reduzindo a quantidade de lixo gerado e oferecendo uma fonte alternativa de energia. “Na agroindústria também existe a possibilidade de transformar resíduos de processamento em energia, como cascas e polpas, pode reduzir custos operacionais e melhorar a sustentabilidade. Essas alternativas não apenas ajudam a reduzir as emissões de gases de efeito estufa, mas também oferecem uma nova fonte de receita para os produtores”, diz.
Adriana ressalta ainda que é fundamental que haja um diálogo contínuo entre todos os setores envolvidos no agronegócio, incluindo o governo, instituições de pesquisa, e a sociedade civil, para encontrar soluções práticas e viáveis para as questões de sustentabilidade. Ela destaca ainda que a inclusão do agronegócio no mercado de carbono deve ser vista não apenas como uma obrigação regulatória, mas como uma oportunidade de transformação do setor, promovendo competitividade, preservação ambiental e responsabilidade social.
“A construção de um futuro sustentável exige um esforço conjunto, onde todos os atores se sintam parte do processo e engajados em buscar soluções que beneficiem tanto o meio ambiente quanto as gerações futuras. Além disso, a conscientização do consumidor sobre a origem dos produtos e o impacto ambiental de suas escolhas também pode impulsionar a demanda por práticas agrícolas mais sustentáveis, criando um ciclo virtuoso em prol da sustentabilidade no agronegócio”, conclui.