O metalúrgico, cientista social e presidente da Federação Estadual dos Metalúrgicos da CUT (FEM/CUT), o são-carlense Erick Silva, teve papel importante na formatação da nova política industrial do Brasil. Ao longo de meses, ele e várias outras lideranças atuaram ao lado do vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin se debruçaram sobre o tema para buscar propostas que unissem geração de emprego e renda e sustentabilidade. Nesta entrevista exclusiva ao SÃO CARLOS AGORA ele explica todo o trabalho realizado e as perspectivas para a nova indústria nacional.
SÃO CARLOS AGORA- Como foi sua participação na formulação das políticas voltadas aos incentivos às montadoras e ao projeto da Nova Indústria?
ERICK SILVA - Inicialmente, quando falo de minha participação, deve-se entender o trabalho de um grupo grande de dirigentes e assessores dos nossos 13 sindicatos que representam 56 municípios, onde trabalham mais de 220 mil trabalhadores organizados pela Federação dos Metalúrgicos da CUT no estado de São Paulo, entidade que tenho a honra e o prazer de presidir. Esse grupo é muito capaz e associado a várias outras entidades e pessoas das universidades do Estado, e também de empresas como VW e Toyota.
Pudemos discutir o processo de transição energética como metalúrgicos da CUT no estado de São Paulo, quase a metade da nossa base é trabalhadora em montadora ou autopeças, então veja a importância da indústria automotiva pra nós.
Assim, criamos um debate desde 2021, chamado “Híbrido/Etanol - o motor do futuro”, para os trabalhadores pudessem entender as transformações em curso e as oportunidades que se apresentam.
Além dos metalúrgicos, participaram representantes dos químicos e outras categorias, além das indústrias sucroalcooleira e automotiva, governos e demais entes da sociedade se envolveram no debate que foi muito rico e passou por várias regiões.
Dessa forma construímos sólidos entendimentos sobre o que é importante para os trabalhadores, e para o desenvolvimento soberano do nosso país. Todos os resultados e propostas resultantes desse trabalho foram entregues ainda em 2022 para os então candidatos Geraldo Alckmin e Fernando Haddad, e no momento posterior para o governo.
SCA - Como foi trabalhar ao lado do ministro Geraldo Alckmin?
ERICK - Tivemos várias oportunidades de apresentar o andamento dos estudos para o então candidato a vice -presidente desde o início de 2022. Depois, no período de transição, e com mais profundidade nesses quase 24 meses de governo, com outros ministérios também, sempre com o interesse dos trabalhadores de nossa parte e o ministro focado no que é fundamental para o desenvolvimento da indústria e do país. O vice-presidente e ministro tem grande entendimento sobre a indústria nacional, conhece as fragilidades e as oportunidades, sobre o hidrogênio por exemplo, sem falar na capacidade de pensar as políticas públicas. Além da transição energética pudemos falar como vice-presidente sobre políticas nacionais como da produção do aço.
SCA - Os críticos falam que a política industrial de Lula é "mais do mesmo". Mas o que se vê é um projeto sintonizado com a sustentabilidade e até mesmo com o agronegócio e a agricultura familiar.
ERICK - O Plano de neoindustrialização é absolutamente inovador, inclui avanços determinantes com a concentração dos projetos no BNDES e contempla plenamente as oportunidades da transição energética onde o Brasil se coloca de forma vantajosa. A ideia de compatibilizar desenvolvimento industrial e ampliação da produtividade da agricultura familiar por exemplo traz condições de desenvolvimento social nunca contemplados. Toda a política é ancorada em missões, focado nas oportunidades de futuro. Adicionalmente temos o MOVER, nome dado ao novo regime automotivo que substitui o ROTA 2030, retomando as obrigações de conteúdo nacional como estabelecidos no INOVAR AUTO e foi abandonado pelo governo no último período.
Ainda no Brasil temos a indústrias de indústrias, os fabricantes de máquinas, que são estruturantes, e devem ter atenção redobrada na ampliação da capacidade da nossa indústria de alimentação, potencialmente competitiva nas exportações e capaz de reduzir o valor dos alimentos no país.
SCA - Que efeitos o senhor acredita que estas políticas terão a curto, médio e longo prazo?
ERICK - A indústria automotiva já anunciou neste ano valores de investimentos inéditos, novas plataformas para lançar carros eletrificados, fábricas de carros elétricos novas e recuperação das fechadas no período passado. Incluindo São Carlos, que no acordo fechado pelo sindicato produzirá novos motores e componentes.
A indústria de autopeças tem projetado que o potencial brasileiro com o etanol, deve alavancar a produção do motores, automóveis e outros equipamentos. A base de energia limpa disponível no Brasil tem atraído também investimentos na produção de equipamentos, hidrogênio verde, e outras aplicações de futuro.
SCA - O sucesso da agropecuária brasileira é, inegavelmente, resultado do sucesso da Embrapa, que é uma estatal muito elogiada. O Sr. Acredita que a Embrapii pode ter o mesmo papel para o setor fabril?
ERICK - È certo que o projeto de desenvolvimento com base no conhecimento da EMBRAPA é um dos mais bem sucedidos do Brasil, e coloca o país em condição de vantagem frente a qualquer país do mundo.
O modelo da Embrapa replicado para a indústria, representado pela EMBRAPII, deve criar as bases para a retomada da indústria nessa nova janela de oportunidade que a transição energética oferece.
O Brasil tem todas as condições de competir com vantagem nessa nova realidade mundial, precisamos de políticas públicas, mas também da iniciativa privada.
No Brasil, diferente dos países capitalistas centrais, o investimento privado em pesquisa e tecnologia é quase insignificante, isso também precisa mudar.