Segundo o último Censo Agropecuário (2017) quase 20% das propriedades com atividade pecuária são gerenciadas por mulheres. Pensando nesse público, a Embrapa Pecuária Sudeste desenvolveu um curso com foco só para o público feminino - pecuaristas de corte e de leite e extensionistas - atendendo às exigências de conteúdo e adequação de dias, horários e formato (on-line e presencial). A conclusão da capacitação ocorreu nesta quinta-feira, 26, com um conteúdo específico para as técnicas. Os tópicos gerais foram finalizados na quarta-feira, 25.
Os encontros tiveram início ainda em agosto, na sede da Embrapa Pecuária Sudeste, em São Carlos. A continuidade dos assuntos foi trabalhada de forma virtual. Para fechar a capacitação, as alunas vivenciaram várias práticas no campo.
A pesquisadora Claudia De Mori, da Embrapa, idealizadora do curso, conta que durante esses dois meses de aprendizagem e troca de experiências, especialistas de diversas áreas abordaram planejamento, manejos de pastejo e pastagem, estratégias de produção sustentáveis, bem-estar animal, melhoramento genético, entre outros assuntos.
Para a pesquisadora, um efeito imediato da capacitação é a reflexão dessas 35 participantes sobre o processo de produção realizado nas propriedades gerenciadas pelas pecuaristas e o uso de novas tecnologias para o desenvolvimento do trabalho pelas extensionistas. Além disso, a partir de agora, estabeleceu-se uma rede para compartilhar conteúdos e vivências. "A ideia é ter um espaço de conhecimento para as mulheres, mas que elas participem em todos os outros eventos. Não queremos mais ver nos cursos técnicos duas ou três mulheres e 40 homens. A iniciativa visa também fortalecer a participação feminina e reduzir as desigualdades de gênero no meio rural”, destacou Claudia.
A técnica da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (Cati), de Itapeva (SP), Francine Tomaz Nicoloff, afirmou que o curso agregou novos conhecimentos, não só como profissional, mas como mulher. "Eu vou conseguir levar soluções tecnológicas para o produtor com mais facilidade e segurança, com embasamento científico. Além do mais, foi muito interessante trazer um grupo só de mulheres, porque temos outra visão de produção e sensibilidade. Por ser mulher, quando estamos na propriedade nós conseguimos conversar não só sobre os problemas técnicos, mas até dos problemas familiares e que acabam impactando no dia a dia da fazenda. Temos mais empatia”, fala Francine.
Atuando na agropecuária há mais de 20 anos, a consultora e especialista em gestão Alessandra Decicino conta que o curso foi uma experiência ímpar. "As pesquisadoras trouxeram práticas que estão em constante evolução para melhorar a produtividade com sustentabilidade. Trouxeram resultados de pesquisas que podem ser levados para os produtores lá na ponta. Além disso, a mulher se sente mais à vontade para participar de uma maneira mais ativa. Em determinados eventos, ela pode se sentir insegura e suscetível a fazer questionamentos e tirar dúvidas. Ainda, acredito que fortalece a participação feminina, estimulando outras mulheres e levando respostas com suporte científico para serem aplicadas na propriedade", disse Alessandra.
Abadia Helena Gomes da Silva, que gerencia uma propriedade em Dourado (SP), trabalha com café, soja e pecuária. Apesar de pequena, a fazenda conta com várias atividades. "Estou buscando práticas comprovadas. Por exemplo, a desmama lado a lado eu vi na Internet e tentei implantá-la, mas os colaboradores ficaram desconfiados. Agora, eu aprendi aqui (no curso) e estou super segura em impor a desmama lado a lado e vai dar super certo. Os trabalhadores também usavam choque elétrico, mas eu aboli tal prática. O próximo passo é fazer integração de culturas, café com floresta", enfatizou. Durante os 30 anos de gestão, a produtora conta que sempre sofreu com a desconfiança dos colaboradores. Mas seu marido a apoiou nos projetos empreendidos. Depois desse curso, segundo ela, plantaram mais uma sementinha, abrindo novos horizontes e mais conhecimentos para enfrentar os novos desafios.
A capacitação também teve o objetivo de fortalecer a participação feminina no meio rural e de contribuir com o enfrentamento das desigualdades de gênero nesse setor, em sintonia com o papel da Ciência para alcançar a meta 5, dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da ONU.