
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou no final do mês passado que o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) deverá ser encerrado em abril. A decisão já era esperada, já que, pela lei que regulamenta o benefício, ao atingir o teto de R$ 15 bilhões, o Perse seria extinto no mês seguinte.
“Houve foi uma reunião em que nós demonstramos que todas as projeções até março superam os R$ 15 bilhões, que é um compromisso que todos querem honrar, inclusive os parlamentares que estiveram aqui comigo, que lideraram o Perce nos seus três anos de existência. Todos concordam que o Perce acaba com R$ 15 bilhões”, confirmou o ministro, ao negar a possibilidade de prorrogação.
Haddad destacou ainda que, de acordo com as informações prestadas pelas empresas, as projeções indicam que os valores devem superar o teto até o final de março, chegando a R$ 16 bilhões. “Então, o que nós convencionamos? As empresas passam a recolher a partir de abril, ou seja, o Perce termina, mas se ao final do processo de auditagem dos dados, que deve acontecer no fim de maio, por ventura as projeções da receita não se confirmarem e faltar R$ 100, R$ 200, R$ 300 milhões para chegar nos R$ 15 bilhões, nós sentamos à mesa e vamos verificar a forma de que o valor dos R$ 15 bilhões seja atendido. Mas isso nós só vamos ter a certeza de que aconteceu daqui a 60 dias”, explicou.
O Perse é uma iniciativa do governo brasileiro criada em 2022 para apoiar o setor de eventos, que foi gravemente afetado pela pandemia de COVID-19. O programa visa fornecer auxílio financeiro, incentivos fiscais e outras formas de suporte para ajudar na recuperação econômica das empresas e profissionais desse setor.
ESPECIALISTAS CRITICAM O FIM DO PERSE
Para Evelin dos Santos de Oliveira, do Lassori Advogados, ao contrário do que se possa pensar, o Perse não cria uma "casta privilegiada", mas corrige um desequilíbrio gerado pela pandemia, que impactou o setor de eventos de forma desproporcional. “Diferente de outros segmentos, o setor de eventos foi um dos últimos a retomar suas atividades plenamente, sofrendo perdas financeiras severas”, comentou ela.
A especialista esclarece que, além disso, as empresas beneficiadas pelo Perse estruturaram seu planejamento tributário com base na continuidade desse regime até 2027, conforme estabelecido na Lei nº 14.148/2021. “A retirada abrupta do benefício compromete contratos, investimentos e a sustentabilidade financeira do setor, gerando insegurança jurídica e contrariando o princípio da proteção à confiança legítima, reconhecido pelo STJ em casos de incentivos fiscais concedidos por prazo certo e condição específica. A imposição do teto financeiro de R$ 15 bilhões pela Lei nº 14.859/2024 também viola essa segurança, restringindo o acesso ao benefício sem qualquer previsão na legislação original”, critica ela.
De acordo com Evelin, a decisão de limitar o Perse pode trazer prejuízos consideráveis. “Estudos indicam que o fim do programa pode retirar até R$ 244 bilhões da economia por ano. Além disso, a extinção abrupta do Perse pode levar a um aumento expressivo no desemprego e à redução da arrecadação tributária, afetando não apenas as empresas diretamente beneficiadas, mas também setores correlatos”, comenta.
De acordo com a advogada, do ponto de vista jurídico, a revogação parcial do Perse pode ser questionada com base no artigo 178 do CTN, que protege incentivos fiscais concedidos por prazo certo e condição específica. O STJ já reconheceu que a aplicação de alíquota zero equivale a uma isenção tributária, sujeita à proteção do artigo 178 do CTN, o que reforça a ilegalidade da restrição imposta pela Lei nº 14.859/2024.
Ela ressalta ainda que dados indicam que, em 2022, o setor acumulou um estoque de 3.617.274 empregos formais no Brasil, um aumento de 110.843 postos de trabalho em relação a 2019. “Somente no primeiro semestre de 2023, foram criadas 12.438 novas vagas no setor. Além disso, a injeção de recursos no setor movimentou uma massa salarial de R$ 71,8 bilhões e um faturamento anual de R$ 291,1 bilhões. “A retirada do Perse coloca em risco essa recuperação, podendo resultar em demissões em massa e fechamento de empresas”, comenta.
Outro especialista no tema, o advogado João Henrique Gasparino, sócio do Grupo Nimbus, destaca que o Perse teve um impacto direto na preservação de empregos, especialmente no setor de eventos, que é um dos maiores geradores de empregos no Brasil. “Dados da Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape) revelam que o setor de eventos registrou um crescimento de 400% e foi responsável por um aumento significativo na criação de vagas. No ano passado, o setor gerou 23,5 mil empregos, representando um aumento de 46% em relação a 2022. Além disso, a economia de eventos contribuiu com R$ 4,65 bilhões em impostos federais, com um impacto direto no PIB, o que mostra que o Perse teve um papel fundamental na estabilização do setor”, destaca.
Ele comenta que com a iminente extinção do programa, o setor pode enfrentar uma nova onda de demissões, já que muitas empresas dependem do benefício fiscal para manter seus quadros de funcionários. A confusão em torno do fim do Perse e o teto de R$ 15 bilhões estão gerando incertezas entre as empresas, que temem não conseguir sustentar seus empregos a longo prazo.
Gasparino alerta que o fim do Perse coloca em risco a recuperação do setor de eventos, que ainda está se reerguendo das severas perdas causadas pela pandemia. A Lei 14.148/2021, que criou o programa, inicialmente estabeleceu que os benefícios seriam concedidos até 2027, mas a atual reformulação trouxe a possibilidade de encerramento antecipado do programa devido ao limite de R$ 15 bilhões. “De acordo com a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o fim do Perse pode gerar perdas de até R$ 244 bilhões na economia anualmente, uma vez que o aumento no faturamento de eventos gera três empregos formais a cada R$ 10.000. É importante que o Congresso reconsidere o fim abrupto do Perse e avalie a real capacidade do setor de eventos de se manter sem o apoio fiscal”, conclui ele.